Tratamento para a asma na gravidez – sim ou não?

Tratamento para a asma na gravidez – sim ou não?

 Tem asma e está grávida… e agora? A asma é a doença crónica mais comum na gravidez, atingindo entre 3,4 a 12% das futuras mães. Estudos demonstram que existe uma grande probabilidade de o estado da doença se alterar com a gravidez. Cerca de um terço das mulheres piora quando engravida, sobretudo se já possui um quadro de asma moderado a grave; um terço melhora e o restante terço mantém a sua condição estável ao longo de toda a gravidez. A possível alteração do estado da asma na gravidez deve justificar uma visita da grávida a um especialista em asma, dado que a vigilância médica deve ser mais cuidada. Há vários factores que podem contribuir de forma positiva ou negativa para a alteração do estado da asma na gravidez. Esses factores são, normalmente, bastante particulares, pelo que é quase impossível prever qual vai ser a evolução do estado de uma asmática após engravidar. Substâncias como a progesterona podem favorecer a situação clínica da asmática, já que esta hormona possui propriedades broncodilatadoras, que “abrem” as vias aéreas e facilitam a respiração. Também o aumento dos níveis de cortisol, comum na gravidez, oferece protecção contra a inflamação das vias respiratórias causada por alergénios. Por outro lado, há outras substâncias que prejudicam o desempenho das vias aéreas, aumentando a probabilidade de haver uma crise de asma. O stress resultante das inúmeras mudanças que a gravidez acarreta pode também contribuir para uma evolução negativa da asma na grávida. 

Porque deve continuar com a medicação? Analisando prós e contras 

Quando engravida, um grande número de mulheres tende a abdicar da medicação para a asma. Cerca de 23% pára de tomar os corticosteróides inalados, 13% abdica da toma dos agonistas de curta acção e 54% deixa de tomar os corticosteróides para alívio rápido das crises de asma. Por sua iniciativa ou mal aconselhadas pelo médico, as grávidas justificam a cessação terapêutica com o medo de que os fármacos tenham efeitos negativos no feto. No entanto, estas mulheres desconhecem que várias investigações demonstram claramente que, no caso de uma grávida ser asmática, a principal ameaça para o seu bem-estar e o bem-estar da sua criança é a falta de controlo sobre a asma, sobretudo quando se trata de um caso de asma grave. 

As crises de asma na gravidez ocorrem com maior frequência entre as 24 e as 36 semanas de gestação. As infecções respiratórias parecem ser as principais causadoras das crises agudas de asma nas mulheres grávidas (34%), logo seguidas pela não adesão aos cortiscosteróides inalados (29%). A asma não controlada, especialmente quando resulta numa crise, gera um decréscimo significativo do oxigénio que circula no sangue da grávida. A diminuição do nível de oxigénio na corrente sanguínea da mãe leva a que o feto não receba a quantidade de oxigénio de que necessita, o que compromete o seu desenvolvimento, crescimento e poderá mesmo ameaçar a sua vida (o que só acontece em casos extremos). 

Alguns trabalhos de investigação demonstram que a asma não controlada por parte da mãe aumenta o risco de parto prematuro e do bebé ter um peso abaixo da média quando nasce. A probabilidade de existir restrições de crescimento intra-uterino é maior no caso de ter havido episódios de crises asmáticas durante a gravidez. Outros autores notam que existem mais casos em que é necessário recorrer a uma cesariana entre as mulheres com a doença não controlada.  

Em suma, resultados de estudos distintos apontam no mesmo sentido: a asma grave, quando associada a falta de controlo da doença, está associada a resultados piores na gravidez, com consequências negativas para o feto. 

Assim sendo, as mulheres asmáticas grávidas devem tomar medicação para controlar a doença e ter consigo fármacos de alívio rápido dos sintomas, para a eventualidade de terem uma crise. Os planos terapêuticos devem ser optimizados para assegurar um controlo absoluto do estado clínico da grávida. Mais do que nunca, devem ter o máximo cuidado com a exposição a alergénios, adoptando políticas rigorosas de evicção alérgica dentro e fora de cada. Na eventualidade de haver uma crise, as medidas de tratamento devem ser agressivas, pois é importante que a grávida normalize rapidamente, para não restringir a quantidade de oxigénio que chega ao feto. Infelizmente, alguns estudos evidenciam que, quando têm uma crise, as mulheres grávidas não são tratadas de forma tão eficaz como poderiam e deveriam. Segundo um trabalho de investigação, quando comparadas com mulheres com asma não grávidas, verifica-se que as grávidas com asma recebem menos cortiscosteróides, sobretudo no momento da alta. Ou seja, os médicos que atendem estas mulheres no Serviço de Urgência receiam receitar estas substâncias na gravidez. O mesmo trabalho demonstra que estas mulheres, subtratadas, têm uma probabilidade 3 vezes superior de voltar a ter um episódio de asma aguda a curto prazo. 

Porque parar de tomar a medicação? Desmistificando os medos… 

Afinal, há medo de quê? Embora exista o mito de que a medicação pode afectar a criança, apenas uma pequena percentagem dos agentes activos (10%) chega ao feto. Os restantes 90% são metabolizados pela placenta.   

É de conhecimento geral que os cortiscosteróides usados por via oral, quando usados muito frequentemente e em quantidades muito elevadas, têm efeitos secundários sérios. Estes efeitos negativos já são despreziveis quando os corticóides por via oral são tomados apenas durante poucos dias. Está também comprovado que o uso adequado destas substâncias por via inalatória, em quantidades centenas de vezes menores, não acarreta problemas para a saúde e constituem uma terapêutica eficaz. Assim, não há motivos para parar de tomar a medicação quando se engravida, desde que se cumpram as recomendações do médico.

Relativamente aos cortiscosteróides orais tomados na gravidez, na mãe, podem aumentar o risco de infecção e a intolerância à glucose e provocar diabetes gestacional. Alguns estudos relacionaram a toma de cortiscosteróides orais com um aumento do risco de hipertensão e pré-eclampsia. Contudo, tendo em conta as consequências adversas resultantes da ausência da medicação se esta for necessária, o uso de cortiscosteróides orais continua a ser clinicamente recomendado. É que a probabilidade destes fármacos desencadearem efeitos secundários é muito baixa. Pesados os prós e os contras da toma de corticosteróides, os especialistas nesta área não têm dúvidas: tomar a medicação é o procedimento mais seguro para a mãe e para o feto. 

Outras complicações fetais como lábio lepurino ou fenda no palato aparecem pontualmente relatadas em associação ao consumo de certos fármacos por via oral (mas não inalados)para o controlo da asma durante o primeiro trimestre da gravidez. Mas analisemos dados concretos: as investigações concluíram que o risco destes problemas ocorrerem é apenas de 0,3 a 0,4% superiores ao risco existente em qualquer gravidez sem qualquer medicação. Valerá a pena arriscar o pleno desenvolvimento e até a vida do seu bebé (que poderá ser afectado com uma crise durante os 9 meses de gravidez e de abstenção de medicação) tendo como justificação uma hipótese tão remota? 

Os agonistas de curta e longa acção e os cortiscosteróides inalados são seguros, podendo ser usados com toda a tranquilidade na gravidez. Outros fármacos mais agressivos são utilizados com maior reserva e com maior necessidade de vigilância médica contínua. Mas o seu médico especialista pode aconselhá-la, tendo sempre em vista o seu bem-estar e o bem-estar da criança. 

É normal que a grávida tenha uma grande preocupação com o bem-estar do seu bebé e é natural que queira conhecer todas as opções, todos os riscos e todas as consequências para o feto que advêm do seu comportamento. Mas não devem ser vencidas por medos infundamentados nem deixar que certos mitos as desviem das decisões mais sensatas. No caso de estar grávida e ser asmática deve consultar um especialista. Fale com o médico e discuta as vantagens e desvantagens de tomar a medicação. O médico não lhe receitará nada que afecte a saúde da sua criança, por isso, se for aconselhada a continuar a medicação, esteja tranquila. Todas as recomendações e provas científicas vão nesse sentido. 

 

Fontes:
http://www.aaaai.org/patients/publicedmat/tips/asthmaandpregnancy.stm 

http://thorax.bmj.com/cgi/content/full/56/4/325